Brincou certa vez o saudoso Millôr Fernandes que, para aumentar a sensação de espaço em casas e apartamentos apertados, basta aprender a andar nas paredes e no teto. Não é má ideia. Claro, será preciso antes esvaziar as paredes e o teto dos mil objetos e penduricalhos que vamos ali depositando ao longo da vida. Adoramos entulhar de coisas os lugares que habitamos – até o momento em que não mais conseguimos habitar.
A questão não tem necessariamente a ver com tamanho: tem gente que compra um palácio e continua se sentindo apertado. O lugar do habitável não está na extensão (extensio), mas no espaço (spatium): no vazio a partir de onde criamos e somos criados. Já dizia Einstein: não estamos n’O espaço: somos espacialmente estendidos. Assim sendo, não haverá problema algum em habitarmos o ar e, consequentemente, aprendermos a andar pelas paredes e pelo teto.
Gosto muito de uma passagem de Heidegger na qual ele afirma que habitar é um demorar-se junto às coisas. Ou seja, uma relação temporal: ali onde me demoro, ali sou, ali moro, ali habito. Nesse tempo, ocorre uma transfiguração mágica: já não há mais uma porção de espaço, mas um lugar – MEU lugar. Uma conquista amorosa e paciente (o tempo que em si mesmo espera, não expecta). Amor.
O amor liberta.
Alberto Heller
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O amor liberta… ou escraviza. Depende do ponto de vista! Ótimo texto, como sempre. Abs.