Imagine por um minuto que você é uma célula: uma das milhares de células que compõem, digamos, o fígado de uma pessoa. E você está de saco cheio disso. Você acorda um dia puto da vida e decide que não irá mais exercer aquela função: a partir de hoje você será uma célula livre e independente, e passará os dias meditando e lendo Dostoievski. Você até pode fazer isso, mas continuará vivendo e sentindo o que as outras células ao seu redor estão vivendo e sentindo. É o inferno da vida em sociedade: não há independência total. Claro, na vida real temos pernas, diferentemente da célula em questão; podemos nos refugiar em algum fim de mundo e fingir que estamos livres da influência do grande grupo. Mas não estamos. Por mais “individuais” que pretendamos ser, pertencemos a uma macroestrutura, a um superorganismo, e estamos interconectados: o que o grupo sente, você sente. Se o grupo adoece, você também fica doente; se o grupo enlouquece, você enlouquece junto.
E a loucura – disse certa vez Nietzsche – pode ser a exceção no indivíduo, mas é a regra nos grupos. Delírios coletivos, paranoias de massa – e você no meio, sendo arrastado involuntariamente por uma maré invisível e à qual não há como resistir. Você pode até discordar, rejeitar, lutar, opor-se – mas não escapa à força e influência dessa correnteza.
Enfim, escrevo isso porque estou de mau humor, e percebo que toda a gente ao meu redor está de mau humor. Quem começou, eles ou eu? Certamente nem eu nem você, amigo leitor, mas sim um terceiro (sempre um terceiro, maldito terceiro).
Mas não hoje, hoje não! Acenderei meu incenso, respirarei fundo e me concentrarei em minhas criações: acenderei minha pequena vela em meio a essa grande escuridão e não permitirei que
[dor! – a chama da vela queimou meu dedo]
Alberto Heller
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Ainda bem que homem não tem TPM… ia compreender o que é mau humor "sem nem saber de onde vem, ou quem começou…" kkkkk! Ótima reflexão… somos um indivíduo coletivo, mesmo sem querer…