Era um retiro de idosos numa pequena cidade alemã: uma soprano e eu apresentamos lá um recital de canto e piano com obras de compositores sul-americanos. Pareciam estar gostando muito. Até que, em dado momento, uma senhora em cadeira de rodas começa a chorar em meio a uma canção. Ótimo, pensei, estamos interpretando bem. Mas trocou a música e a velhinha continuava chorando. Puxa, emocionou mesmo! Mais duas músicas e o choro não passava – pelo jeito a coisa tinha pego fundo. Uma enfermeira apareceu e empurrou a cadeira até outra sala. Findo o concerto, já me dirigindo à saída, vejo a senhorinha num canto ainda chorando e murmurando algo; apiedado, aproximo-me para confortá-la, quando finalmente ouço o que ela resmunga repetidamente em meio às lágrimas: “Não gostei, achei horrível, não era isso que eu queria ouvir, façam eles irem embora!”.
Pois é, as coisas nem sempre são como pensamos que são. Os enganos aparentam: alguns riem sérios, outros vibram quietos; alguns entristecem em sorrisos, outros falam por silêncios. E há ainda as falsidades, claro. E as sublimações. E os desajeitos. E os mistérios. Há de tudo, muito.
Por isso, cautela: não julgue apressadamente (mas também não jogue fora a primeira intuição). E se após um concerto alguém te disser que “até chorou de emoção”, desconfie: pode ter sido a emoção por ter acabado.
Alberto Heller