Na febre dos manuais de autoajuda, tudo parece possível e alcançável – desde que se sigam certas regras, desde que se cumpram determinados “programas”: os dez passos para se chegar à felicidade, os sete degraus para a vitória, as oito etapas da dieta infalível etc. Você só precisa de paciência, disciplina e muito (MUITO) esforço. Afinal, deve provar que é merecedor do grande prêmio, prêmio que não está lá para todos, apenas para os que suportam o calvário e demonstram assim ser dignos. Desconfie das soluções fáceis; ria dos que propuserem opções rápidas: chegar lá é (tem que ser) muito (MUITO) difícil!
Hermann Hesse, no livro Siddhartha, conta a história do príncipe que chegou a Buda; em dado momento, este reencontra seu amigo Govinda, parceiro de anos na busca pela iluminação. Govinda lhe pergunta justamente por que Siddhartha chegou à iluminação e ele, que a buscou com tanto afinco e por tanto tempo, não, recebendo como resposta que “quando alguém procura ocorre facilmente que o olho só veja o objeto que procura, que não encontra nada nem se permite interiorizar nada porque só pensa no que busca, porque tem um objetivo e porque está obcecado por esse objetivo. Procurar significa: ter um objetivo. Encontrar, porém, significa: ser livre, estar aberto, não ter um objetivo. Tu, ó caro, és em realidade um dos que buscam, pois, perseguindo teu objetivo, deixas de ver o que está ao alcance dos teus olhos”.
Bonito. Interessante. Mas não pode ser assim tão simples. Desconfiados, continuamos procurando, continuamos buscando. E quando estamos a ponto de encontrar – nos assustamos! – e voltamos a procurar. A busca nos protege do encontro, a viagem nos afasta do objetivo. Calma: isso é típico do estágio nº11; depois melhora…
Alberto Heller
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Não como Renata, mas como Fernanda que sou, usando um pc que não é meu, me inquieto lendo artigos neste Blog, um me levando a outro, interesse despertado via Face e seus infindáveis links… O que busco ou busquei afinal (?!), sem estar obcecada, no entanto, talvez fascinada com a palavra métrica e sutilmente arranjada, frases belas, reflexões férteis. Mais, e mais, e mais…
Protejo-me do encontro com o que me despertou 'a santa e profana Curiosidade', a viagem feita até aqui me afastou do objetivo? Depende do encontro esperado e do objetivo realmente claro e objetivado imagino.
Quando a senhora genuína curiosidade te coloca na busca, no caminho, na viagem, na trilha, podemos sim nos perder, dispersar, esquecer o objetivo ou nem ter claro que o tenha, e jamais encontrar o que se esperava. Não deixa de ser um objetivo com liberdade. Eis o deus tempo a jogar, a brincar com nossa instabilidade e vulnerabilidade no carrocel das emoções e sentidos. Tudo na impermanência, a macaca mental a pular de galhos em galhos. Mas existe o tal foco? A meta. O alvo. A seta que espera, que objetivamente indica, mas subjetivamente nada garante.
A tal liberdade, não aprisionada, aquela que pulsa, que vibra, que compõe a vida e suas histórias, que é?
Sidharta, se não tivesse buscado o que sentia/imaginava/queria/precisava talvez tivera encontrado outra coisa mesmo (e encontrou várias antes da decidir parar e compartilhar o que encontrara), e se os súditos não procurassem não existiria o Budismo.
O objetivo me dá a estrutura, o esqueleto (nem sempre imprescindível); o que move e faz mover talvez seja o sentimento muscular e a intuição articular. E cuidado!!! Em excesso pode causar danos à saúde. Moderação, paciência e persistência sempre. o 12o estágio. Prefiro a entrega, a única prisão real é a circunscrita ao corpo pele-limite-densidade.
Valeu o estímulo. Objetivo alcançado. Encontro limitado.
Olá Fernanda, só hoje vi seu comentário, muito obrigado por participar e escrever, seja sempre bem vinda!