Aconteceu há muitos anos, mas por alguma razão a lembrança voltou esta semana. Era uma aula de Yoga, e ao final da prática a instrutora sempre fazia uma pequena meditação, uma leitura ou algo do gênero. Naquele dia ela pediu que nos sentássemos no chão, segurássemos uma perna de cada vez com um dos braços – como quem segura um bebê no colo – para que com a mão livre fizéssemos massagem e carinho nessa perna. Creio que também era para conversar com ela (agradecer-lhe por nos carregar de lá para cá todos os dias ou coisa parecida). Primeiro olhei para a professora com minha melhor cara de “você não está falando sério”; depois, tentando esconder minha irritação, consultei o relógio na parede, pensando numa boa desculpa para levantar-me e fugir daquele disparate embaraçoso. Mas ao constatar a imediata adesão dos colegas (e não querendo constranger a professora – mais do que eu mesmo já estava), decidi ficar.
Ainda com vergonha (e me certificando de que ninguém me olhava), comecei a fazer carinho na minha perna. Até que era gostoso! Continuei. Subitamente me dei conta de que nunca na vida fizera um carinho nela; pensei em pedir-lhe desculpas por isso – à perna (não me atrevi a falar em voz alta, mas pensei bem forte para que ela me ouvisse). Fiquei emocionado.
Não temos o costume de nos fazer carinho. Nem físico nem muito menos mental. Na verdade o que acontece com maior frequência é o oposto: brigamos permanentemente conosco mesmos, nos castigamos, nos torturamos, nos enchemos de culpas e de medos. Tivéssemos chicotes, os usaríamos nas próprias costas e ainda jogaríamos sal nas feridas.
Às vezes preenchemos a falta de prazer com entretenimento e diversão. É sempre agradável, faz a gente esquecer momentaneamente da falta… mas ela continua lá. Não sabe que é triste, acostumou-se a ser assim. Esquecida. Fecha os olhos e adormece: mais um dia.
Alberto Heller
6 Comentários. Deixe novo
Alberto, esse teu texto é espiritualmente muito interessante, mas não deixa de ser cômico… e é. rss
Obrigado pela reflexão a lá comédia da vida privada.
EXATAMENTE QUERIDO! GRATIDAO POR CADA PEDACINHO!!!
É para se pensar, Luis Alberto Heller Veríssimo! Parabéns pelo texto!
Quando o espiritual passa pelo riso – melhor ainda rsrsrs. Abraço!
🤗
Obrigado! Abração!